domingo, 22 de fevereiro de 2009

Equador







Pela primeira vez em muitos anos, deparei-me seguidor assíduo de uma telenovela da TVI, o Equador. Não tanto por ter lido a obra em que a novela se inspira. Muito menos por a achar um trabalho de altíssima qualidade. Pessoalmente, julgo que um projecto televisivo que conte com a presença da Alexandra Lencastre fica, no mínimo, com a sua qualidade altamente ameaçada.
Ainda assim, sigo essa novela com um certo prazer. Adoro filmes de época. Há neles como que uma sub-reptícia nostalgia por um tempo que já passou. Depois de as coisas acontecerem, é quase irresistível não reflectir no que teria sido a vida, se tivéssemos agido de maneira diferente. Talvez seja precisamente aí que resida o interesse de um filme de época; na reflexão de quem, já sabendo o resultado, se limita a contemplar antigas encruzilhadas com aquele sorriso manhoso, porém cansado, de quem revisita uma questão de cuja solução residiria a cura de muitos males. Revendo-se a questão, apercebemo-nos na tendência dos Homens para andarem em círculos. Talvez por isso goste de filmes de época. Gosto de revisitar antigos pontos de partida. É um pequeno intervalo a que me dou o luxo, quando necessito de parar e respirar um pouco.
Esta mini-série, novela, filme de época alargado, ou como a preferirem chamar, passa-se em inícios do século passado. Um retrato de uma Belle Époque apropriadamente bacoca, onde os apelos por progresso coabitavam com condições laborais análogas á escravatura. Como ponto de equilíbrio tínhamos uma Monarquia enfraquecida por invejas externas e por demagogos de botequim internos. O rei estava só. Ter o apoio do exercito era da máxima importância. Criticava-se a falta de uma visão mercantilista para os assuntos do país, a falta de uma visão materialista.
O que me chamou a atenção no equador foi uma frase dita por uma personagem secundária, aparentemente sem importância: “Estes estúpidos de cá, ainda não perceberam que quanto mais ameaçado esta o rei, mais ameaçado esta o império.” Sinceramente, nunca antes me teria passado pela cabeça que seria em uma novela da TVI que veria resumida, em uma única frase a razão de ser do Estado Português: preservar. A Monarquia, primeiro, a I República, depois, e o Estado Novo, por último, autodestruíram-se na ânsia da preservação de uma certa portugalidade, embora ninguém soubesse exactamente do que isso se tratava. Foi preciso uma novela da TVI para me aperceber disso.
Foi então que me apercebi do brilhantismo da II Republica. Nada como regressar a antigos pontos de partida, de facto. O actual regime garantiu a sua sobrevivência precisamente porque a sua própria existência reside não numa tentativa de preservar algo, mas sim, numa paulatina entrega de tudo, numa bem-educada e politicamente correcta desistência. Vejamos, desistiu-se do Império com a descolonização, desistiu-se de um tecido empresarial forte com as nacionalizações, desistiu-se de uma sociedade civil livre com um Estado pesado e burocrata, desistiu-se da estabilidade com este semi-presidencialismo radicalmente parlamentar, desistiu-se do trabalho, do esforço e da poupança com o crédito fácil e a generalização do incumprimento. Perante as dificuldades das nossas deficiências estruturais, tornamo-nos bons mercantilistas, exímios materialistas e optamos por uma racional desistência. Apercebemo-nos de que, se mais nada nosso houver que possa ser ameaçado, então nós próprios não seremos alvos de ameaças, e poderemos continuar a nossa boçal existência em paz, no nosso cantinho, a ver os inigualáveis sucessos da nossa Selecção e a distrairmo-nos com aquela banalidade chamada “Caso Freeport”. Como me disse hoje um amigo meu, não vale a pena tentarmos fazer nada para resolver a crise, porque não temos condições para isso. Antes esperar que os outros a resolvam e que com isso nos tirem do lamaçal. A II Republica esta a entranhar-se no nosso espírito. Nisso é o regime politico de maior sucesso. Será que da falta de materialismo do Sr. D. Carlos passamos ao materialismo não racional e doentio do Eng. Sócrates?
Vou repetir-me, gosto de filmes de época, gosto de revisitar antigos pontos de partida, velhas encruzilhadas. São pequenas paragens de quem necessita d se por um bocado aparte do rodopio enlouquecedor da existência. É bom parar, voltar ao passado. Não nos devemos tornar meros autómatos. É necessário reflectir. Rever de onde viemos, para não nos esquecermos de quem somos. É bom rever antigas épocas, antigos mundos, pois eles muitas vezes não são mais do que sombras do mundo presente. E pensado nisso, o título da novela e da obra são bastante apropriados_ Equador. Afinal, o equador não é só a linha que divide a Terra em hemisfério norte e hemisfério sul. É também a linha de fronteira entre dois mundos

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Novas Oportunidades - Erro de casting

Este governo Socrateiro não convence ninguém. Parece-me, contudo, que porventura será o governo menos mau que tivemos. Só que isso não chega, não deixa de ser mau. Para mal de todos nós, Sócrates é intelectualmente fraco, mas mediaticamente fortíssimo. Curiosamente na oposição, a cassete que tinha a tocar era a de que o governo de Santana Lopes é que era o governo da cosmética e da irrealidade. A única diferença é que Santana Lopes tinha a fama e Sócrates tem o proveito.
Agora no governo é uma autêntica alíce no país das maravilhas, prestes a entrar num 2009 encantado. A sua política, ao invés de se centrar no governo eficiente de uma nação débil e na, consequente, resolução dos seus problemas estruturais, assenta na propaganda colorida, no mediatismo detalhadamente preparado que se consubstancia em aparições sebastianistas perversas e alheias às necessidades e realidade nacional.
O Magalhães encaixa, que nem uma luva, nisto.
O narcisismo de Sócrates provocou-lhe grande sofrimento psicológico quando o responsável de marketing escolheu o nome de um navegador português e não o de um filósofo grego.
Dentro desta forma de politicar surgiram as Novas Oportunidades. Todos já perceberam o alcance fictício, do ponto de vista pedagógico, deste programa.
Todos sabem que o objectivo não é qualificar nem enriquecer social ou culturalmente alguém.
O único a ter interesse neste programa é o governo. Meramente está presente o egoísmo obsessivo de apresentar estatísticas(antes/depois) desnexadas com a verdade qualíficacional da população.
Sócrates é um vendedor de ilusões. E as ilusões pagam-se. Mais tarde, mas bastante caro.
Se o governo pretendesse exercer o seu papel governativo orientado para a realidade nunca apresentaria um programa de qualificação e formação fictícia, desrespeitosa e fraudulenta.
De facto não faz sentido ministrar qualificação desnecessária e improdutiva a quem já tem a sua idade e mais importante a sua "oportunidade", quando existem montanhas de licenciados(muito mais qualificados do que qualquer outra simples vítima deste programa), sem vislumbrarem qualquer "nova oportunidade" num horizonte razoável. A boa governação exigiria a preocupação primeira pela solvência dos problemas dramáticos e estruturais que criam dificuldades de empregabilidade aos milhares de jovens licenciados e não a preocupação cínica e propagandística pelos que já têm o seu trabalho e irão gastar recursos que não trarão riqueza e produtividade a Portugal.

Uma questão de exemplo

A política e, principalmente, os seus agentes, os políticos acusam um enorme descrédito perante os portugueses.
Os cidadãos simplesmente não acreditam, não confiam e não podem gostar destes políticos.
Infelizmente cheios de razão. Eu que pretendo vir a assumir um papel político (para além deste) e que até há pouco tempo não embarcava neste sentimento, vitimizando e desculpando para além do admissível a classe política, sinto-me, no presente, terrivelmente incomodado face a tão vergonhosas situações.
Mais me repugna, o facto de serem episódios recorrentes e intemporais, como que enraizados na cultura de fazer política, quando deveriam vigorar valores totalmente antagónicos.
O caso que vos trago é paradigmático, pelo que podem as minhas conclusões e propostas ser objecto de desejáveis e urgentes analogias.
Ora não posso admitir que simples presidentezecos de câmaras municipais andem para trás e para frente de BMW, Mercedes, Audi ou Volvo, muitos com motorista e , do mesmo modo, os ministros nunca sentem os glúteos em carros inferiores a 75000 euros, enquanto os contribuintes se vão esforçando no quotidiano para assegurar-lhes tão bom nível de vida.
Qual a autoridade de algumas destas figuras para pedir sacrifícios? Qual a justificação que subjaz a tais gostos e vaidades não compatíveis com a nossa insignificância económica?
Não há um argumento válido, a não ser o de ter veículos que garantam um alto nível de segurança, mas este só é aplicável às grandes figuras, casos do PM ou PR.
O raciocínio que predomina é o seguinte: pedimos aos contribuintes para se sacrificarem porque os tempos são de crise e país é pobre, mas nós (políticos) continuamos a manter os mesmo luxos ridículos e desnecessários, e pior, gastamos tanto ou mais nestas mordomias que os países ricos.
Se os políticos franceses, espanhóis ou ingleses podem andar em bons carros, sorte a deles em serem ricos e fortes, mas o povo deles também vive melhor, é mais rico.
Temos de adequar os nossos desejos às nossas possibilidades, daí que lanço o desafio ao parlamento: elaborem uma lei que equipare o valor máximo a gastar na aquisição dos veículos ao salário mínimo nacional ou ao rendimento médio nacional comparativamente à nossa vizinha Espanha. Isto é, se em Espanha se ganhar 1000 euros de salário mínimo e o ministro da presidência tem ao seu dispor um carro de 150 mil euros o nosso homologo só poderá adquirir um carro baseado num valor proporcional à diferença do salário mínimo.
Se os carros não forem tão bons como são, talvez não se adquiram carros novos sempre que muda o presidente de câmara ou sempre que termina um mandato.O exemplo de Santana Lopes e o Audi 8 que gasta 20 e poucos litros/100 é apenas uma gota ilustrativa no panorama endividadíssimo das autarquias.
Porque não há diferença prática e racional em um presidente se fazer transportar num carro de 25 mil euros em vez de 60 mil euros.
É-me penoso abordar este tema, porque se insere num conjunto de questões sensíveis, em que facilmente que incorre em populismo demagógico.
Contudo, mesmo em temas sensíveis, o direito à critica não nos pode ser vedado, mas não poderá jamais ser mal interpretado.
Para mim, não está em causa o dinheiro que se gasta mal gasto, mas sim a desconsideração por quem lhes paga mordomias, iguais às de países ricos, tendo um rendimento disponível muito inferior.
Estão, a meu ver, verdadeiramente em jogo valores e princípios. Está em causa a aplicação da máxima de que “ o exemplo deve vir de cima”, que terá, concerteza, de ser transposta e imposta pela lei.
Porque, uma vez mais, temos aqui em evidência a falta de cultura democrática, de sensibilidade social e de adequação à realidade político-económica, pelo que só a lei poderá impor e instituir tais valores norteadores do exercício de cargos públicos.
Só respeitando os contribuintes, dando exemplos quanto à boa administração do seu esforço, poderão os políticos ser respeitados, ouvidos e credibilizados.