domingo, 21 de dezembro de 2008

Pode o medo da Deflação lançar-nos em uma Inflação descontrolada?

É certo que não sou ninguém para fazer comentários profundos sobre a matéria. É certo, ainda, que não acrescentarei nada de novo sobre a questão. Porém, como vivemos em um Mundo onde é lugar-comum ter uma opinião fundada e profundamente pseudo-informada sobre o tudo e o nada, sob pena de sermos tomados por pessoas desinteressantes, ou pior, por fulanos sinceros no nosso desconhecimento, não me vou coibir de dar uma opinião sobre o perigo da deflação.
Ocorre que, neste último mês, muitos têm sido aqueles que alertam que a presente crise revela sérios sinais de se afundar em uma deflação. Memórias negras daqueles que não viveram as catástrofes da década de 1930 e que, para variar, falam de cor, retirando umas frases feitas de uns quantos manuais escolares ou da velha, mas conveniente, cartilha partidária. Não deixa de ser interessante presenciar a artificialidade do medo de quem participa no inicio do fim de todo um modo de vida. É impressionante como até as manifestações de receio parecem manchadas por uma dose de alheamento. Ainda há um ano o perigo do fim do Mundo residia em uma inflação descontrolada. Hoje, contudo, está presente na deflação e a inflação elevada é a nossa aliada para a combater.
Este género de raciocínio linear peca, a meu ver, pela sua estreiteza. Nem a inflação, nem a deflação são isoladamente o alfa e o ómega do Mundo como o conhecemos, antes pelo contrario, a relevância destas reside verdadeiramente quando tomadas seu conjunto, como se de siamesas se tratassem. Nesse sentido, e como estas não deveram ser tomadas isoladamente, para manter uma Sociedade em um nível certo, entre inflação e deflação, um equilíbrio entre muito e pouco crescimento económico revela-se necessário. A seguir a um movimento de expansão, segue-se um movimento de retracção, sendo que ambos não deveram ser descontrolados. A questão, todavia, não reside em uma qualquer fórmula matemática de cálculo exacto. Caso contrário, como justificar que de uma previsão de um lucro para 2008 na ordem de 60 milhões de euros, a TAP acabasse por anunciar um prejuízo na ordem dos 170 milhões? A Economia, enquanto ciência social, não é exacta. O elemento humano acresce-lhe uma dose de indeterminismo. Muito mais importante do que calcular activos e passivos, é a gestão das expectativas. Ora, esta, por seu lado, necessita de credibilidade, tanto por parte da Sociedade Civil, como do Estado. Assim sendo, é relevante assinalar no processo de capitalização da CGD a recusa pela Banca Internacional do aval do Estado Português. Será isto indício de que os níveis de endividamento do Estado estão já a ultrapassar o comportável? Os sucessivos anos de deficits e de ausência de superavits primários, tanto em períodos de expansão, como em períodos de contracção terá enfim corroído a credibilidade do Estado Português enquanto devedor? Não deixa de ser relevante o facto de em 2005, este ter descido da categoria AA para A- em matéria de capacidade e respeitar os seus débitos em organizações bancárias internacionais. Afinal, quando Keyneys defendeu na década de 1930 o recurso ao endividamento e a gestão de deficits crescentes, ou seja, o recurso a uma política orçamental que impulsionaria para patamares elevados a inflação, a divida pública do estado britânico rondava os 600 milhões de libras em 1932. Em 2008, porém, o Estado Português requereu ao BEI um empréstimo na ordem dos 40 mil milhões de euros. O contexto histórico entre estas duas situações será então certamente díspar. Daí, consequentemente, o risco de se lançar mão de velhas receitas que embora tendo funcionado no passado, não terão que forçosamente ser bem sucedidas no presente. Atender aos particularismos do caso concreto revela-se fundamental, pois, ao contrário do que muitos convenientemente mencionam, a História não se repete. Os Historiadores é que tendem a repetir-se.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Projecto estratégico - Desígnio nacional

O investimento estrangeiro criará emprego e gerará, em simultâneo, inovação e produção de materiais tecnológicos que, por sua vez, serão alvo de exportação, resultando globalmente em criação de riqueza.

















À luz desta incontestável construção lógica, não podemos deixar de apontar que as apostas estratégicas perspectivadas pelo governo são, manifestamente, redutoras, básicas, insuficientes e inconsequentes.
De facto, Portugal acaba de desperdiçar as duas últimas décadas, porque seguiu o caminho mais fácil. Seguiu o caminho que implicava menos coragem e nenhuma imaginação. Tais opções estratégicas descoordenadas traduziram-se em obras públicas, um pouco por todo o país, cujo financiamento foi alimentando descontroladamente, ao ritmo de 10% /ano, o aumento da dívida externa.
Não seria, de todo, gritante tal evolução da dívida caso os investimentos que a originaram, tivessem rentabilidade, no mínimo, superior aos encargos. Pelo contrário, assistimos a crescimentos económicos comparados sempre frouxos.
Qualquer política económica que radique, obstinadamente, em auto-estradas, comboios de alta-velocidade e aeroportos é pautada pelo facilitismo político. Alguém duvida de que a política do betão é a coisa mais simples que existe? A solução do puzzle está no enquadramento dos elementos potenciadores num quadro estratégico orientado para a ignição propulsiva do esquema lógico acima exposto.
TGV e Aeroporto sim, mas como braços-direito de um desígnio nacional, isto é, objectivados como meios que potenciem a concretização de todo um modelo económico. Isolados e encarados como principais objectivos nacionais nunca gerarão mais riqueza do que despesa, que se traduzirá em maiores transferências de capital para o estrangeiro( juros do financiamento) do que criação de valor cá dentro( aumento do PIB). Esta diferença é reflectida pelo Rendimento Nacional Bruto, indicador do bem-estar social. Fazer obras e investir desta forma torna-nos mais pobres.
Estão, portanto, enunciados os consecutivos erros estratégicos que podem resumir-se a uma simples inexistência de rumo, seria ridículo e infantil pela análise ficar-me.
Se tenho dito que seguimos nos últimos 20 anos o caminho laxista, não me cumpre, nada menos, do que apontar o caminho “difícil”.
“Difícil”, porque uma vez reflectido e estruturado, jamais poderá questionar-se a sua execução. O caminho difícil implica uma compilação estratégica, cujos desideratos últimos, só se verão concretizados a muito longo prazo, ao contrário do caminho fácil, em que constrói-se hoje e vê-se amanhã, sendo de um impacto constante e limitado. Para seguir o rumo correcto é preciso muita coragem, muita determinação, muita paciência e muito sentido de Estado.
Posto isto, a questão óbvia é a de encontrar os fenómenos que desencadearão interesse e, decorrentemente, investimento estrangeiro.
A mão-de-obra é uma palavra-chave. A mão-de-obra só será competitiva através do seu baixo custo ou pela sua altíssima qualificação e especialização. A nossa mão-de-obra só foi razoavelmente competitiva quando os salários eram muito baixos, tendo e bem perdido esse factor de competitividade. Salários baixos não é, já nem será o futuro. Daí que tenhamos de apontar baterias para a qualificação de elite dos portugueses e não só, como adiante explicarei. Na actualidade, a mão-de-obra nacional está num meio-termo, embora relativamente qualificada não o é o suficiente para figurar num ranking das mais procuradas e apesar dos vencimentos serem baixos, também já são elevados demais para ser condição de investimento.
Fica assente, então, que no contexto actual, só uma mão-de-obra de referência pode ser alvo de cobiça estrangeira, pelo que a questão é como alcançá-la.
Numa primeira fase teremos que edificar infra-estruturas de topo inseridas num pólo tecnológico. Se ambicionamos oferecer e ministrar um ensino de excelência ter-se-à de dispor de meios físicos de excelência. Temos de construir as mais avançadas infra-estruturas universitárias do mundo, designadamente construir o melhor laboratório que alguma vez existiu. A excelência, inovação e magnificência serão os padrões orientadores das infra-estruturas orientadas para as vertentes científica e tecnológica. Outro fenómeno que será desafiante e, imensamente, estimulante é o da integração e interacção do actual ensino superior com este pólo universitário originando um super-cluster.
No entanto, não basta ter as melhores instalações para aumentar a competitividade do nosso ensino. Há que preenchê-las com os melhores. A aposta deverá ser, igualmente, forte no corpo docente. Temos de entrar num autêntico mercado da massa-cinzenta, pagando mais do que os outros. Alguém tem dúvidas de que os cérebros portugueses que exercem a sua actividade no estrangeiro, prefeririam ficar em Portugal se pagássemos o mesmo, com as mesmas condições?
Temos de inverter o processo de que fomos vítimas ingénuas. Trazer de volta os nossos investigadores e cientistas e atrair os seus congéneres estrangeiros. O esforço financeiro a fazer para contratar os melhores tenderá a ser menor quanto maior for o prestígio, daí que a alavancagem inicial reveste-se de assinalável decisividade. Um outro efeito associado ao aumento exponencial do prestígio é a atracção natural dos melhores alunos mundiais, mormente asiáticos, que procuram o melhor ensino(melhores instalações e melhores professores), que acabarão muitos deles por estabelecer um vínculo emocional e profissional com o nosso país, contribuindo para a aceleração e consolidação de todo o projecto.
Estruturado que esteja este pólo universitário de referência, está criada a alavanca desencadeadora do tão almejado investimento estrangeiro que gerará muito emprego. A sinergia do pólo com o investimento suscitará a inovação e desenvolvimento de produtos científicos e tecnológicos dentro das nossas fronteiras, evitando as importações e fomentando as exportações, combatendo agressivamente o défice comercial. Como corolário final deste projecto estratégico, atingiremos taxas de crescimento económico muito acima da média, ou seja, criação de riqueza, sem que daí resulte transferências externas avultadas, bem pelo contrário.
Resta-me concluir dizendo que a nossa felicidade está aqui. Está a uma distância de 15, 20 anos. Duas décadas de paciência e determinação para compensar duas décadas de erros. Inverteremos a nossa realidade e contrariaremos a que nos espera. Porque actualmente, 6% do nosso PIB serve para pagar juros da dívida externa, consequência de obras que criaram menos riqueza do que despesa. E em comparação, e não se riam nem chorem, a percentagem do PIB afecta ao ensino superior fica-se pelos 0,71%. Estes números por si só revelam a inexistência estratégica de um país que governa a pensar no amanhã de manhã e masoquísticamente vai repetindo a receita do investimento público avulso e imediato. Pensem nisto: sabem qual a pior coisa que nos pode acontecer se decidirmos tentar ser felizes?

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Quota de renovação parlamentar

Muito se fala de renovação política, muito se fala de renovação de ideias, muito se fala de mudança, mas importa aferir qual o contributo e vontade dos que falsamente a proclamam, nomeadamente a actual classe política, aqueles que têm de sair para libertar espaço.
De facto, as estruturas intermédias e de topo dos partidos são completamente imutáveis, não se registando ascensões de base encaradas como um fenómeno natural e cíclico.
Mas também nos salta à vista que os dirigentes partidários estão esgotados, ultrapassados mas não sabem nem querem ceder o lugar a sangue-novo, reformista e dinâmico.
Não gosto de imposições legislativas, mormente imposições cívico-politicas, mas quando os titulares de cargos públicos não sabem exercer e respeitar os mais elementares princípios de vivência político-democrática, surge aqui a necessidade de instruí-los a “saber estar”, e principalmente, de educá-los a “saber sair”.
Esta proposta que vos apresento, deveria ter sido adoptada logo nos primeiros passos da nossa democracia, de forma a criar hábitos e moldar comportamentos, impor regras de exercício, criar uma cultura de exercício de funções politicas compatível com as regras democráticas.
Acham que são os políticos actuais que nos vão oferecer o futuro que desejamos?
Ninguém acredita neles, ninguém tem esperança neles, mas ninguém pode substitui-los porque eles estão agarrados ao poder.
Daí que proponho, sem a mínima hesitação, a criação de uma quota de renovação partidária em que uma fracção assinalável de deputados teria de ser substituída de legislatura para legislatura, criando assim uma nova vaga que percorreria os partidos cheia de energia, esperança e motivação.
Quando Cavaco Silva questiona o o facto dos jovens não se interessarem pela política, a resposta resume-se a uma palavra: oportunidades.
Os jovens, em primeiro lugar, não têm sentido necessidade de intervir, de se mobilizar, vivendo as suas vidas sem questionar o mundo à sua volta, atitude que poderá vir a sofrer alterações em virtude do agravamento das condições sociais e económicas.
E por outro lado, os poucos jovens, mas suficientes, com vocação e interesse, sentem-se totalmente estrangulados e asfixiados numa hierarquia partidária estanque em que o mérito pouco conta, ao contrário do lambe-botismo.
Que mundo sujo é este, em que as oportunidades a que deveríamos ter acesso para podermos impor as nossas ideias e valor são-nos negadas?
Assume-se portanto de extrema urgência a criação de medidas legislativas que promovam a renovação partidária obrigatória, sendo este um dos mais importantes contributos para essa causa. Mas, em Portugal, os acomodados desviam as atenções para quotas de mulheres, sendo a quota de renovação parlamentar , esta sim, uma proposta que merece ser debatida e pensada a bem da democracia.

Futebol Português – Novo modelo competitivo

É mais do que óbvio que o futebol português atravessa graves dificuldades financeiras, tendo por isso o seu futuro verdadeiramente ameaçado.

Na origem destes problemas financeiros está a baixíssima capacidade de produzir receitas, de vender eficazmente o produto futebol.

O que acontece hoje em dia é que só 6 ou 7 das 16 equipas do escalão principal é que apresentam saúde financeira minimamente aceitável.

Todas as restantes serão uma vítima da inércia destruidora e insustentável a que o futebol português está votado.

Isto é, se a conjuntura se mantiver, e irá manter-se se nenhuma intervenção de fundo se realizar, estes clubes terão que fechar a porta.

É uma inevitabilidade.

Portanto, eu acho fundamental reformar o modelo competitivo.

Temos de obrigatoriamente de operar uma redução do numero de clubes.

Entendo não haver condições para ter mais do que 10 clubes em Portugal.

Esta reformulação da estrutura competitiva permitiria fortalecer a robustez financeira dos clubes já anteriormente viáveis, bem como seria um jackpot para aqueles clubes que mais cedo ou mais tarde encerrariam, dando-lhes assim oportunidade de finalmente atingirem patamares de estabilidade financeira bastante tranquilos.

Porque o que realmente interessa é existirem mais jogos entre os grandes, mais jogos entre boas equipas, mais jogos com bons jogadores que assegurem de antemão um espectáculo de qualidade.

E o que não interessa, apesar de esta afirmação ser politicamente incorrecta, é jogos entre a académica-naval, entre o Setúbal e o Leixões, e por ai adiante. E digo isto porque já vi estes jogos várias vezes e a qualidade dos intervenientes é tão irritante, que não só não atraem ninguém, como afastam do futebol aqueles que antes iam. Nem com bilhetes à borla estes jogos merecem a deslocação ao estádio. Esta é a mais pura das verdades.

O que eu quero é que estas equipas joguem mais vezes com equipas boas e aumentem as receitas para poderem investir no seu plantel e terem também um produto próprio de qualidade para apresentar nos relvados.

A crítica de que já temos poucos jogos e a redução de clubes agudizaria ainda mais a questão não é aceitável, uma vez que pretendo mais jogos ainda, mas jogos com interesse, isto é, em vez do Benfica e o Porto se defrontarem duas vezes por época , passariam a jogar 3 ou 4 vezes dependendo do esquema competitivo a adoptar, por exemplo playoff.

Outra crítica: a de que isto acabaria com as equipas que tinham que ir para a segunda divisão é, também, absurda porque essas equipas iriam acabar era se continuassem na primeira divisão actual. Não nos podemos esquecer que a maioria das equipas tem salários em atraso e não vejo uma inversão notória e convincente da evolução dos passivos. O que vai passar é que em vez do futebol português ficar reduzido a 7 clubes débeis, ficará com 10 clubes viáveis e robustos.

Só com uma competição interna com elevados padrões de competitividade e qualidade é que conseguiremos impor-nos no futebol europeu, ou por outra, aumentar o ranking português para colocar mais equipas para trazermos mais dinheiro.

Até os contratos publicitários e televisivos teriam um valor redobrado quando renegociados em virtude do maior interesse que os jogos suscitariam traduzido em audiências televisivas consideravelmente superiores.

O caminho é este, o de reduzir o número de clubes. Mas o problema surge quando se pretende efectivar a mudança depois de diagnosticado o problema e encontrada a solução.

O interesseirismo do dirigismo desportivo, acompanhado da incultura e ignorância que lhe é intrínseco, torna a adopção desta reforma completamente impraticável.

Os dirigentes desportivos querem estar no poleiro o máximo de tempo, e para isso precisam de resultados, que passam pela manutenção na primeira divisão, mesmo tendo consciência para onde arrastam o clube. Mas como não lhes interessa o seu clube, mas sim o momento em que lá estão e podem desfrutar, no mais amplo sentido, não poderiam de forma nenhuma aceitar e votar a implementação de medidas que colocariam o seu tacho em risco.

Sinto-me a partir deste momento exonerado de qualquer responsabilidade pelo rumo do futebol português uma vez que o caminho está traçado, faltando somente levá-lo a cabo.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Irá provar a crise nos mercados que o milagre chinês é uma falácia?


Desde que a crise imobiliária norte-americana se deu por iniciada em 2007, que muito se tem discutido sobre a sustentabilidade do poderio ocidental, leia-se, norte-americano. Muitos argumentaram, e argumentam ainda, que esta seria o inicio do fim de uma época onde os EUA eram a potência dominante, e simultaneamente o de baldar de um período onde estes se teriam de contentar com um papel mais secundário.
Ora, muito embora concorde que o que temos vindo a presenciar, não desde 2007, mas mais precisamente desde 2000, com o rebentar da bolha especulativa das Dot.Com, seja em definitivo o paulatino fim de um ciclo Histórico, este, só por si não marcara o fim do domínio Americano. Aquilo com que nos deparamos será algo mais profundo; será o fim de todo um modo de vida.
Com isto, não viso referir-me ao arrefecimento económico registados a nível de consumo, pois julgo que tal seria passar ao lado do cerne da problemática. Actualmente, vivemos num mundo globalizado, onde efeitos, positivos ou negativos se puderam repercutir em um processo de arrastamento por todo o globo, como se de uma viagem de circum-navegação se tratasse, um verdadeiro efeito de dominó, portanto. Por essa razão, o efeito presentemente sentido nos EUA repercutir-se-ão, passo a passo, sendo que estes apresentaram sintomas distintos, em cada uma das específicas regiões do globo.
Agora, focando com maior precisão esta análise, tenha-se em atenção os mais recentes desenvolvimentos na China, pois é aqui, e curiosamente não nos EUA ou na Europa que os principais resultados desta crise se iram produzir. Desde meados dos anos 1980, que as economias chinesas e norte-americanas iniciaram um processo de simbiose, sustentado na emissão de títulos da divida publica norte-americana, prontamente adquiridos pelo governo chinês. Dessa forma, garantia-se que o Estado Norte-Americano conseguisse financiar deficits orçamentais crescentes, baixar impostos e estimular o consumo interno. Em troca, o Governo Chinês via assim garantido um seu grande objectivo, a saber, baixos impostos e elevados índices de consumo, nos próprios USA. Isto, pelo facto de que a economia chinesa, é extremamente orientada para a exportação, não tende ainda hoje desenvolvido um mercado interno. Os seus produtos, por força de custos de produção extraordinariamente baixos, são altamente competitivos em uma Economia de Mercado aberta, onde as classes de consumidores de mais parcos rendimentos, por força da baixa de impostos e da abertura de linhas de crédito ao consumo nos anos de 1990, se encontraram em posição de aquisição. Todavia, esses novos rendimentos disponibilizados para consumo, abriram todo um novo “nicho de mercado”, o qual, para ser eficientemente aproveitado por parte do sector empresarial, levou a que este iniciasse um fenómeno de deslocação industrial para países onde os custos de produção seriam mais baixo, o que, em ultima analise, proporcionaria uma descida do preço dos bens junto do consumidor final, a saber, o tal consumidor de médios ou baixos rendimentos acima mencionado. Ora, um dos países escolhidos, tendo em vista essa deslocação, foi precisamente a China, o que aprofundou ainda mais o feito de simbiose acima mencionado.
Como resultado, a China passou a suportar, simultaneamente, não só a crescente derrapagem orçamental norte-americana, como também, uma parcela significativa do esforço industrial. Como resultado os índices de consumo norte-americanos, e de certa forma, do resto do mundo ocidental, continuariam numa linha crescente. O mercado de consumo interno seria, e é, o grande motor de crescimento das economias ocidentais, enquanto o mercado de exportações seria, e é, o alicerce do chamado “milagre chinês”.
Tudo seria perfeito, não fosse a crise imobiliária de 2007, que conduziu á crise bancária de 2008. Com estas, as premissas que nortearam o crescimento económico do Mundo Ocidental desde 1980 foram claramente postas em causa, o que levanta a seguinte questão: Até que ponto, será a presente simbiose económica com a China pertinente? A quebra dos índices de consumo, por exemplo, na construção civil em Espanha revela que o crescimento económico alicerçado em um mercado interno auxiliado por acesso a crédito fácil e a altos níveis de endividamento já não é viável. A Espanha encontra-se agora em recessão técnica. Em um mundo novo, onde aparentemente a inflação já não será a grande preocupação, mas sim a empregabilidade e a restauração nos níveis de poupança, será pertinente começar a equacionar a possibilidade de uma nova concentração industrial nos países ocidentais, retirando as indústrias da china. Afinal, poder-se-á dizer que a utilidade chinesa, de um ponto de vista puramente económico se deu por finalizada. O mundo da geopolítica é pautado pelo pragmatismo dos interesses, onde a verdade e a utilidade de hoje serão a mentira e a inutilidade de amanha e vice-versa
Termino, relembrando a velha exposição que os mestres gregos, na Época Clássica, faziam acerca da falácia das premissas:”Todos os cães têm quatro patas. O meu gato tem quatro patas. Logo, o meu gato é um cão.”

domingo, 23 de novembro de 2008

A insolvência como instrumento de reorganização do sector automovel: Um caminho possivel para a GM

Nestes últimos tempos, temos vindo a assistir ao que certos autores, entre os quais se destaca o celebrem Francis Fukuyama, designaram “O Fim da Era Reagan-Thatcher”. Aparentemente, ao contrario do que era pensamento corrente nos saudosos loucos anos 90, a Historia ainda não atingiu o seu estádio evolutivo último. A sociedade ocidental liberal e de Mercado não será afinal a apoteose de toda uma caminha. A ausência de titularidade por parte dos intervenientes no tecido produtivo, leia-se consumidores e produtores, de informação prefeita e da inerente impossibilidade de formulação de escolhas perfeitas plenamente racionais e objectivas levaria á necessidade de abandono deste modelo que se havia demonstrado como sendo perfeitamente bananeiro. Esta ausência de racionalidade prefeita e de um equilíbrio entre oferta e procura levaria á necessidade do preenchimento de um vazio deixado entre Consumidor © e Produtor (P) pelo Governo (G). Este velho-novo equilíbrio de cariz keynesiano estaria perfeitamente revelado nos sucessivos “bail outs” que temos vindo a assistir por este Mundo Globalizado fora, e do qual se destaca o Norte-Americano, não só pela avultosa soma de 700 Biliões de dólares envolvida, como também pelo seu simbolismo. É do país de Reagan, para o qual havia emigrado o “monetarismo”, que parte o sinal do falhanço das premissas do “laissez-faire”.
Contudo, esta nova ânsia interventiva do Estado no sector privado, embora compreensível, carrega consigo o sério risco de alastramento para outros sectores do tecido económico, como se de uma verdadeira epidemia se trata-se. Nesta semana, muito se tem discutido sobre a necessidade de um novo “bail out”, desta vez direccionado para o sector a automóvel. Mais uma vez, são os ventos que sopram dos Estados Unidos que moldam o tom da discussão, sendo que, neste caso especifico, o teor simbólico envolvido, a meu ver, reduz a uma mera nota de rodapé nos anais da Historia o “bail out” anterior. Afinal, convêm não esquecer o profundo significado do automóvel não só na psique americana, como também na mundial. Desde os seus primórdios, com o Fordismo que o sector automóvel era um sinonimo de pujança, poder, sucesso.
Ora, as ultimas noticias sobre o estado calamitoso do grupo General Motors (GM) como que deita por terra toda essa imagem, como se o fim de um certo modo de vida se trata-se De facto, olhando mais atentamente para a situação concreta do grupo, verifica-se que a rede de relações em que este é parte foram pensadas para uma era já finda. Relações essas que a não serem repensadas esgotaram qualquer sinal de vida que ainda reste. Porventura, o melhor será ponderar a possibilidade de proporcionar ao grupo uma morte assistida, de admitir a pratica de uma “eutanásia empresarial” ao caso sub Judice.
Passo a explicar: Depois de nos últimos 42 anos a cota de mercado do grupo ter deteriorado de 53% para 20% do Mercado Automóvel a escala mundial, a GM ainda é titular de 8 marcas de automóvel (Cadillac, Saab, Buick Pontiac, GMC, Saturn, Chevrolet e Hummer), contra, respectivamente, 3 marcas da Toyota (19% de cota de Mercado) e 2 da Honda (11% de cota de Mercado), os seus concorrentes directos.
A GM terá cerca de 7000 revendedores, apenas nos Estados Unidos, contra os menos de 1500 da Toyota, e os cerca de 1000 da Honda. Esta maior concentração, por parte dos seus concorrentes asiáticos, possibilita-lhes tanto uma maior capacidade de armazenamento, como uma disponibilidade para apresentar uma maior panóplia de serviços. A GM necessitaria de menos revendedores, inclusive, de menos marcas de automóvel. Contudo, relembremo-nos do velho brocardo romanista, “pacta sunt servanda”, os contratos são para comprir, que neste caso será de relembrar religiosamente, visto que os revendedores, nos EUA, se encontram protegidos contra uma quebra do contrato a nível do legislador estadual, o que torna tal acção astronomicamente dispendiosa para o Grupo. Note-se ainda, que uma percentagem cada vez mais significativa da despesa da GM se destina a pagar pensões de reforma para os seus antigos funcionários. Dá-se inclusivamente a situação assaz caricata de, actualmente, a maioria da despesa com trabalhadores se direccionar para a categoria de antigos funcionários já reformados. Paralelamente, a todo a grupo empresarial do em sentido concreto, este ainda comporta uma dimensão em sentido lato; a saber, toda a miríade de infra-estruturas de pequena ou media dimensão que dependem do grupo para assegurar os seus níveis de facturamento, como será o caso, dos fornecedores. Todos os sujeitos ou entidades acima mencionados pretendem que o presente status quo que se vive na GM seja protegido, mais precisamente, dadas as actuais circunstancias no cenário global, por um “bail out” ao grupo. Ora, em meu entender, uma injecção de capital neste produzirá efeitos nocivos, na medida em que possibilitaria a sobrevivência de um status quo que já não é do todo viável, visto que, uma vez dotados do capital, a pressão para mudanças profundas, isto é, para a reestruturação da empresa, seriam atenuadas, senão mesmo por completo afastadas, o que conduziria a que, a médio prazo, uma nova necessidade de intervenção estadual se tornaria premente, com o pequeno pormenor que aí os montantes envolvidos seriam significantemente superiores aos agora discutimos, nem que fosse por um aumento do número de reformados. De certa forma, poder-se-ia dizer que uma parte do problema da GM é semelhante á questão da solvência da Segurança Social. Aí, os governos ao invés de procurar um incremento da sua intervenção, visam a criação de soluções mitigadas, que passam pela abertura do sector á iniciativa particular, não só via privatização, mas sobretudo mediante a criação ou reformulação de soluções jurídicas, de onde a concessão é destaque. Por muitos que sejam os defeitos da época que agora finda, e de facto estes são imensos, não esqueçamos os seus ensinamentos. Sobretudo, esforcemo-nos por relembrar que o Estado é garante do funcionamento da Sociedade, como tal compete-lhe regular as relações entre sujeitos, tratando o igual como igual e o desigual como desigual, consequentemente, este necessita de ser imparcial. Ora, um excesso de intervencionismo, por muito bem intencionado que a principio fosse, a prazo inviabilizaria a referida imparcialidade, visto que o Estado se tornará crescentmente parte interessada de várias relações, e nesse sentido , cessará de ser efeciente no seu papel máximo de árbitro garante da paz social. Muitas vezes não lhe convirá tratar o igual como igual e o desigual como desigual.
Nesse sentido, será um erro injectar 50 ou 100 Biliões. Com isto não pretendo que o estado deveria ser omisso. Pelo contrario, a intervenção do Estado deve verificar-se, mas naquilo daquilo que é a sua função; o arbitro garante da paz social. Julgo que, no caso concreto da GM, a melhor acção passará por permitir a falência do grupo. Todavia, não uma falência no sentido estrito do termo, no sentido de um puro encerrar de portas, mas sim, no sentido daquilo a que chamei acima uma morte assistida da empresa. Com esta, o que se pretenderia verdadeiramente seria, não um puro encerrar de portas mas uma reorganização em sede de concertação social. Com a proposição do processo de falência a protecção estadual aos revendedores cessaria, seria possível renegociar os contratos de trabalho com os funcionários, e acima de tudo, poder-se-ia discutir a transferência dos pensionistas (ou pelo menos dos futuros pensionistas) ou para o Sistema Nacional de Previdência ou para Seguradoras. Afinal, por muito que no mundo da realidade seja a liberdade que oprime e a ordem que liberte, um excesso de ultima conduz ao atrofiamento da sociedade que a prazo, usualmente se traduz em mais um caminho para a servidão.